quinta-feira

Fome violenta

A fome absurda fez com que o terror sumisse da memória. Não que lembrasse de muitas coisas desde que chegara, mas das poucas que poderia lembrar, agora já teria esquecido. Sua fome era mais forte que seu medo.

Olhou fixo para um boteco lá na frente, e pôs-se a caminhar até lá. O Sol voltou a queimar, a cegar e a soprar na nuca dele. Agora que o caminho parecia extremamente longo, parar na metade seria como deitar numa frigideira em chamas. Por mais que estivesse quase morto, não queria pagar pra ver o que poderia vir depois.

Deu mais 2 passos e o sol sumiu acima dos prédios. Por causa da cegueira e da surdez, não viu muito bem onde se metera. Parecia um beco sujo do centro, onde tinha acontecido uma briga feia. Talvez um drogado que tentou passar o traficante, ou vice versa. Só se sabe que da briga um dos dois não voltou.

Cândido sentiu o estômago vibrar com a cena. A poça de sangue soltava um aroma ferroso. A fome se tornou tão avassaladora que, sem se dar conta, começou a morder as feridas do morto.

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